"...comecei a pensar quando senti minha perna ficando dormente apoiada em meu joelho,
eu tinha a bíblia aberta na palma das minhas mãos, mas não eram as fábulas tradicionais,
era um livro sagrado diferente. Neste livro eu lia a história de um menino
igual a todos os que correram e se sujaram pelas ruas de São Paulo,
que fazia amigos e sempre se aproximava intensamente das pessoas,
compartilhava segredos, choros, pensamentos, lágrimas.
Mas era natural que este menino, no final de cada colisão, permanecesse sozinho
talvez acompanhado de outras,
mas sozinho.
Nevava lá fora e aqui dentro da Cabana está quente, olhando pela janela eu posso enxergar apenas os fios magros e compridos de uma árvore que jazia nua à mercê dos ventos congelantes da madrugada.
Minha perna direita esta completamente dormente e a sensação que isso tem me causa arrepios e dores musculares, inflamando os joelhos até o calcanhar.
Lia palavra por palavra como se minha sensibilidade estivesse anulada,
não estava.
Eu sentia.
Mas as vezes matava meus sentimentos para não perceber o quanto eles doem,
o quanto incomodam.
Assim meu psicológico entenderá que a dor não é importante,
e que não devo me incomodar com sua presença.
O contrário,
a dor pode ser amiga,
companheira,
solidária,
compreensível,
sábia,
e além de tudo... lógica.
Talvez eu seja louco.
Alguém que não vive numa realidade aceita pelos demais,
alguém que canta e fala em voz alta sem se preocupar se alguém vai ouvi-lo,
ou o que vai pensar sobre,
ou o que vai fazer a respeito.
Alguém que vive pelas curtas rédias do próprio pensamento
um que não compreende, mas que traduz
Linha por linha
entre as vírgulas,
O pensamento de um menino
solitário.
Que faz-se poeta entre as letras,
e as que escolhe usar... curiosamente,
tornam-lo o menino deste livro.
Lá fora o frio impetuoso castigava às duas lembranças minhas
de A Última Lágrima,
enquanto a neve caía e nossos corações lentamente se sincronizavam,
eu podia enxergar seus lábios vermelhos e seus olhos reproduzindo um brilhar refletido do branco absoluto que a luz da Lua brilhava no céu. Você era baixinha,
me olhava de baixo com um sorriso discreto curioso e ansioso,
seus olhos me fazem curioso, me pergunto o que ocupa seus pensamentos.
É só uma lembrança...
Na outra você está correndo de mim, parece até clichê,
era o nosso dia e tínhamos visto um filme no cinema,
foi o nosso dia.
Encontramos um morador de rua, socializamos com ele
não consigo me lembrar o que dissemos,
ele respondeu, seguimos em frente
Você me deu um tapa no traseiro, isso me incomodava
você gostava do romântico incomodo que aparentava.
É lembrança de felicidade.
Duas lembranças distintas, do menino
do Poeta.
Uma no livro,
outra na memória.
...e do céu a neve fria e incessante disposta a enterrar ambos..."
Sallut
07.02.2013

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